Marco Regulatório

Novas regras para o saneamento básico

Texto: Redação Revista Anamaco / Reprodução Agência Senado  

O Plenário do Senado aprovou na manhã de quinta-feira (06 de junho) um novo conjunto de regras para o saneamento básico no Brasil. O marco regulatório está contido no PL 3.261/2019, apresentado por Tasso Jereissati (PSDB-CE) para substituir a Medida Provisória 868/2018, que perdeu a validade antes de ser votada. O projeto segue, agora, para a Câmara dos Deputados.
A proposta, aprovada em votação simbólica, abre caminho para a exploração privada dos serviços de saneamento. Caberá à Agência Nacional de Águas (ANA) estabelecer normas de referência para o setor e essas regras devem estimular a livre concorrência, a competitividade, a eficiência e a sustentabilidade econômica na prestação dos serviços, além de buscar a universalização e a modicidade tarifária.
Para os defensores da ideia, a aprovação representa um avanço que vai permitir a melhora do setor e a maior cobertura para a população. Os críticos do projeto, por sua vez, alegam que as empresas privadas vão querer operar apenas nos grandes centros urbanos, onde seria mais rentável, deixando cidades menores e mais afastadas de lado. Além disso, poderia decretar o fim das empresas públicas municipais e estaduais.
A proposta foi aprovada graças a acordos que possibilitaram a aceitação de emendas por parte do relator, Roberto Rocha (PSDB-MA). Ele informou que recebeu sugestões de diversos senadores e procurou atender, na medida do possível, a todos, de modo a assegurar o objetivo maior da proposição: ampliar a competição no setor e atrair investimentos, estabelecendo uma transição suave, capaz de preservar a higidez financeira das empresas estaduais.
Ao chamar atenção para a importância da construção de um bom texto, o senador Eduardo Braga (MDB-AM) lembrou da má experiência da privatização do serviço em Manaus (AM) e disse que o modelo adotado pela capital amazonense não serve de exemplo para o restante do País. “Vinte anos se passaram e as metas continuam não cumpridas na área de esgoto, apesar de a tarifa estar sendo cobrada. Em relação ao abastecimento de água, só foi possível cumprir as metas graças a um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC). Por essas experiências é que nós procuramos, agora, ajudar a elaborar um texto que atendesse não só a grandes regiões com potencial econômico, mas os municípios do interior do Brasil”, explicou Braga.
O senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) disse encarar a proposta com um misto de esperança e temor. Segundo ele, é certo que o atual modelo fracassou, mas seria necessário mais tempo para resolver todas as controvérsias do projeto. Juntamente com outros senadores, Rodrigues chegou a pedir o adiamento da votação, mas recebeu do presidente do Senado, Davi Alcolumbre, a garantia de que o texto voltará à Casa depois de analisado pela Câmara e de que haverá tempo suficiente para posteriores alterações, caso necessárias.

A aprovação pelo Senado foi uma grande vitória, mas há uma brecha que permite aos Estados não comprometidos com os cidadãos renovar os contratos de suas empresas estaduais com os municípios por mais 30 anos sem nenhum tipo de meta ou prazo para universalização

Os senadores Angelo Coronel (PSD-BA), Weverton (PDT-MA) e Zenaide Maia (Pros-RN), mostraram-se  preocupados com o futuro das empresas públicas e de seus trabalhadores. “Sabemos como funciona essa logística. Só o capital privado não resolve de uma hora para outra. Tem de levar em conta o que vai melhorar e para quem. As empresas de telefonia, por exemplo, abandonaram as cidades pequenas. Até hoje não tem sinal de celular em pequenos municípios do interior do Maranhão. As aéreas só querem operar onde ganham, assim como os bancos. Eles não têm compromisso nenhum com o povo. Só querem lucratividade. Além disso, funcionários das empresas estão em risco. Na Câmara, o debate vai ter de ser mais profundo”, avaliou Weverton.
O relator aceitou sete emendas ao projeto, sendo que duas delas foram fundamentais para permitir acordo para aprovação do texto: uma para garantir a prestação dos serviços, inclusive nas regiões mais afastadas do País, com a realização de licitações em blocos de municípios, agregando cidades mais e menos rentáveis; e outra para permitir a contratação da empresa estadual por dispensa de licitação, na hipótese de a licitação para concessão dos serviços ficar deserta ou sem viabilidade econômica que justifique a privatização.
Para os que foram a favor do projeto, a iniciativa vai garantir recursos que não estão ao alcance  do setor público. O senador Carlos Viana (PSD-MG) deu o exemplo de Minas Gerais, Estado com maior número de municípios do País. Segundo ele, a estatal mineira de saneamento é eficiente - embora tenha sido vítima de recentes más gestões, o que prejudicou o atendimento em muitas regiões -, mas dos 853 municípios, apenas 300 têm plano de saneamento.
A senadora Kátia Abreu (PDT-TO) disse que a responsabilidade dos gestores municipais vai ser muito grande, pois caberá a eles escolher bem as empresas responsáveis por prestar os serviços. “Se elas não cumprirem o contrato, terão de pagar multas altas. No Tocantins, por exemplo, onde o setor já foi privatizado há muito tempo, há 40 cidades recebendo o serviço de uma só companhia, que está obrigada a universalizar 80% da coleta e 100% do tratamento de esgoto até 2025”, informou.

Repercussão da aprovação pelo Senado

Diego Cord de Faria, secretário de Desenvolvimento de Infraestrutura do Ministério da Economia, usou as redes sociais para falar sobre o PL 3261. Segundo ele, a aprovação pelo Senado foi uma grande vitória, mas alertou que há uma brecha que permite aos Estados não comprometidos com os cidadãos renovar os contratos de suas empresas estaduais com os municípios por mais 30 anos sem nenhum tipo de meta ou prazo para universalização. “Somente um procedimento licitatório transparente pode garantir que a melhor proposta à população seja alcançada, antecipando prazos e reduzindo custos. Seguiremos com o trabalho para aprovação do texto integral, com o objetivo de atrair mais de  R$ 700 bilhões ao setor e, com isso, garantir o atendimento de 110 milhões de brasileiros”, concluiu.
Otto Von Sothen, CEO da Tigre, também usou as mídias sociais para falar sobre a aprovação do PL pelo Senado. Na sua análise, a medida é um passo na direção correta, mas ressaltou que o espírito público de alguns senadores o entristece. Assim como Faria, observou que, ao permitir a possibilidade de renovação automática por mais 30 anos das concessões, esses representantes do povo demonstram que estão preocupados apenas em preservar suas próprias agendas e privilégios. “Ninguém, em sã consciência, pode estar a favor da perpetuação da fotografia atual de catástrofe. Mais da metade dos brasileiros não tem rede de esgoto e, da rede existente, metade não tem esgoto tratado”, lembrou.
Von Sothen reforçou que 96% das concessões de saneamento estão em mãos das companhias estaduais. “Não permitir que, no momento da renovação, as operadoras privadas possam participar do processo é condenar o cidadão brasileiro a esse quadro de atraso horroroso de doenças e de degradação”, lamentou.
Em apoio à modernização do saneamento básico no Brasil, a Associação Brasileira da Indústria de Materiais de Construção (Abramat) emitiu um manifesto em que declara: “Precisamos urgentemente melhorar a prestação de serviços de saneamento básico no Brasil. O País ainda vive no século XIX quando o assunto é água e esgoto para a população. Hoje, cerca de 34 milhões de brasileiros ainda não têm acesso à água tratada e metade da população não tem acesso aos serviços básicos de coleta de esgoto. A Abramat, em conjunto com entidades, como Associação Nacional dos Comerciantes de Material de Construção (Anamaco), Associação dos Comerciantes de Material de Construção (Acomac) Associação Brasileira de Cimento Portland (ABCP), Associação Nacional da Indústria Cerâmica (Anicer), Associação Nacional de Fabricantes de Esquadrias de Alumínio (Afeal), Sindicato da Indústria da Construção Civil do Estado de São Paulo (SindusconSP) e Sindicato Nacional da Indústria de Cimento (SNIC), defende a aprovação da Medida Provisória 868/2018 no Congresso Nacional. O texto, que traz possibilidades de modernização para o setor de saneamento, precisa de celeridade em sua tramitação porque a saúde e o bem estar de 100 milhões de brasileiros não pode esperar”.

  

Foto: Geraldo Magela/Agência Senado

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